Na
busca incessante de acusações contra a Igreja Católica Apostólica
Romana, e buscando sustentar sua tese já desgastada de que a Igreja
ensina os católicos a adorarem imagens, tem circulado um panfleto
virtual (“meme”) com uma imagem de São Tomás de Aquino e um
trecho da Suma Teológica que estaria dizendo ser devido adorar a
imagem de Cristo.
Os
trechos em questão foram extraídos da Parte Terceira, Questão 25,
Art. 3, na tradução de Alexandre Correia, disponibilizada pela
Editora Permanência, sendo os seguintes:
“Art.
3 — Se a imagem de Cristo deve ser adorada com adoração de
latria.
O
terceiro discute-se assim. — Parece que à imagem de Cristo não
deve ser adorada com adoração de latria.”
“Mas,
em contrário, Damasceno cita Basílio, que diz: A honra prestada à
imagem é prestada ao ser a que ela pertence, isto é, ao modelo.
Ora, o modelo mesmo isto é, Cristo, deve ser adorado com adoração
de latria. Logo, também a sua imagem.”
“4.
Demais. — No culto divino não se deve praticar senão o instituído
por Deus. Por isso o Apóstolo, ao transmitir a doutrina do
sacrifício da Igreja, diz; Eu recebi do Senhor o que também vos
ensinei a vós. Ora, a Escritura nada nos diz sobre a adoração das
imagens. Logo, a imagem de Cristo não deve ser adorada com adoração
de latria.”
“RESPOSTA
À QUARTA. — Os Apóstolos, por uma inspiração familiar do
Espírito Santo, ensinaram certas práticas a serem observadas pelas
Igrejas, que não deixaram por escrito, mas na observância da
Igreja, através das gerações dos fieis. Por isso o Apóstolo mesmo
diz: Estai firmes e conservai as tradições que aprendestes, ou de
palavra, isto é, proferida oralmente, ou de carta nossa, isto é,
por um escrito transmitido. E entre essas tradições está a da
adoração das imagens de Cristo. Por isso São Lucas pintou a imagem
de Cristo, que, segundo se conta, está em Roma.”
O
problema, como de costume, é o que o panfleto não mostra, e esse é
o objetivo desse pequeno artigo, esclarecer o que São Tomás de
Aquino realmente ensina mostrando mais da Suma Teológica.
Antes,
porém, cabe esclarecer que a Igreja Católica Apostólica Romana
possui doutrina oficial, que pode ser consultada no Catecismo
aprovado pela Igreja e disponibilizado em diversos idiomas no site do
Vaticano. E o Catecismo contém o seguinte no parágrafo 2132: “A
honra prestada às santas imagens é uma «veneração respeitosa»,
e não uma adoração, que só a Deus se deve”. Não resta dúvida,
portanto, que não é crido ou ensinado pela Igreja que se deva
adorar imagens, e qualquer um que queira realmente saber o teor da
doutrina católica tem aí a sua resposta.
Veremos,
contudo, que disto não destoa São Tomás de Aquino. De fato,
encontramos na Suma Teológica:
“Sendo
a latria devida só a Deus, não o é à criatura; não o é, no
sentido em que a venerássemos em si mesma. Mas, embora as criaturas
insensíveis não sejam em si mesmas dignas de veneração, a
criatura racional o é. Por isso, não devemos o culto de latria a
nenhuma criatura racional como tal. Sendo, porém, a bem-aventurada
Virgem uma criatura racional, em si mesma, não lhe devemos a
adoração de latria, mas só a veneração de dulia. De maneira mais
eminente, contudo, que às outras criaturas, por ser Mãe de Deus. E
por isso dizemos que lhe é devida, não qualquer dulia, mas a
hiperdulia.” (ST, P. III, Q. 25, Art. 5).
Portanto,
o Doutor Angélico ensina claramente que adoração somente é devida
a Deus, a veneração a pessoas, sendo que nem mesmo à Virgem Maria
é devida adoração, e quanto às coisas, como as imagens em si
mesmas, nem mesmo veneração é devida.
Assim,
não se pode dizer que São Tomás de Aquino defenda a adoração de
imagens, pois claramente rejeita mesmo a veneração senão a
pessoas. De fato, ele explica que “Não prestamos o culto de
religião às imagens consideradas em si mesmas, como coisas: mas,
enquanto conducentes ao Deus incarnado. Ora, o culto pela imagem,
como tal, não finda nela, mas, tende para o ser que ela representa.
Logo, prestar o culto de religião às imagens de Cristo não
diversifica a ideia de latria nem a virtude de religião” (ST, P.
II, S. II, Q. 81, Art. 3).
Disto
já se tem o suficiente para ver que a acusação de que este grande
Santo e Filósofo ensine a adorar imagens é infundada. Resta mostrar
o que São Tomás de Aquino efetivamente ensina no texto do qual
foram extraídos os trechos colacionados no panfleto.
Seguindo
o método escolástico, São Tomás de Aquino propõe uma questão:
“Se a imagem de Cristo deve ser adorada com
adoração de latria”, e inicia a resposta com a antítese: “Parece
que à imagem de Cristo não deve ser adorada com adoração de
latria”, e prossegue apresentando os argumentos para tal antítese:
primeiro que a Escritura diz para não fazer imagens, segundo que a
adoração de imagens é uma prática pagã, terceiro que a adoração
a Cristo decorre de sua divindade pois não se deve adorar o homem
por ser imagem de Deus, e quarto que a Escritura não ensina a
adoração de qualquer imagem. Até parecem as objeções dos
protestantes de hoje.
Depois
traz manifestação no sentido contrário, que representa a Tradição
da Igreja: “Mas, em contrário, Damasceno cita Basílio, que diz: A
honra prestada à imagem é prestada ao ser a que ela pertence, isto
é, ao modelo. Ora, o modelo mesmo isto é, Cristo, deve ser adorado
com adoração de latria. Logo, também a sua imagem”.
Esse
é um dos trechos transcritos no panfleto. Na verdade é uma citação
de São João Damasceno, ao defender o uso das imagens contra os
iconoclastas no século VII. E embora mencione a adoração da imagem
(de Cristo), havia explicado que esta se dá na verdade Àquele que a
inspira (o modelo), por este ser digno de adoração. Damasceno
estaria defendendo não a adoração da imagem propriamente dita, o
objeto seja pintura ou escultura, mas a adoração por meio dele do
Deus feito homem, o Cristo. É exatamente com esse sentido que São
Tomás prossegue defendendo essa afirmação.
De
fato, a resposta, com a tese defendida por São Tomás, vem a seguir:
“Como
diz o Filósofo, a nossa alma se aplica com duplo movimento, a uma
imagem, à em si mesma, como uma determinada coisa e enquanto imagem
de alguém. E entre esses dois movimentos há a diferença seguinte:
o primeiro movimento, pelo qual nos aplicamos a uma imagem, enquanto
uma determinada coisa, difere daquele pelo qual nos aplicamos ao ser
a que ela pertence; ao passo que o segundo movimento, cujo objeto é
a imagem como tal, é idêntico ao que tem por objeto o ser ao qual
ela pertence.”
Assim,
citando o Filósofo, isto é, Aristóteles, em seu pequeno tratado Da
Memória e da Recordação, São Tomás entende que o ser humano pode
se dirigir a uma imagem visando a própria imagem, isto é, o objeto
em si mesmo; mas que, ao contrário, pode se dirigir à imagem
visando não ao objeto, mas sim àquele que a imagem nos traz à
mente.
Hoje,
podemos pensar na fotografia de uma pessoa querida, uma mãe, um
filho. Ninguém pega uma fotografia destas com desdém, e é comum
que se as aperte contra o peito, ou que se beije a imagem da pessoa
na fotografia, num sinal de amor e saudade. É óbvio que ninguém em
sã consciência ama o papel impresso e a tinta. O amor expresso
nesse movimento à fotografia na verdade é direcionado à pessoa ali
fotografada. É esse um movimento do segundo tipo mencionado por São
Tomás de Aquino, e aqui ele se encontra plenamente coerente com seu
ensinamento em parte anterior de sua obra: “o culto pela
imagem, como tal, não finda nela, mas, tende para o ser que ela
representa”.
Prossegue
então em sua resposta: “Donde, pois, devemos concluir, que à
imagem de Cristo, enquanto uma determinada coisa, por exemplo,
madeira esculpida ou pintada, nenhuma reverência é prestada, por
que reverência só é devida à natureza racional”. Aqui São
Tomás fala daquele movimento do primeiro tipo, dirigido à imagem
enquanto objeto em si (madeira esculpida ou pintada) dizendo com
clareza e precisão que nenhuma reverência lhe deve ser prestada.
Prossegue
ele: “E daí resulta que lhe prestamos reverência só enquanto
imagem”. Ou seja, se enquanto objeto em si mesmo a imagem nada
significa, qualquer gesto de veneração ou adoração que, de modo
exterior, aparente e material a ela seja dirigido, somente pode ter
por destinatário aquele do qual ela é imagem, representação, ou
seja, àquele ao qual ela nos remete. Novamente o Doutor Angélico
está apenas repisando aquilo que já disse, como visto acima.
“Donde
se segue que a mesma reverência é prestada à imagem de Cristo e ao
próprio Cristo”. Isto é, se o movimento se dirige a Cristo mesmo,
não ficando na mera pintura ou escultura, então esse movimento deve
ser o devido ao próprio Cristo. A consequência evidente é esta: se
o Cristo é adorado, quem se dirige à imagem dEle, enquanto imagem
meramente que aponta para o Cristo mesmo, dirige-se ao próprio
Cristo, e, portanto, deve estar realizando um gesto de adoração,
não da imagem propriamente mas do Cristo. E nesse sentido conclui
São Tomás de Aquino: “Sendo, portanto, Cristo adorado com
adoração de latria, consequentemente a sua imagem deve ser adorada
também com adoração de latria”.
Resumindo:
se a imagem em si mesma nada significa, ela somente recebe qualquer
reverência na medida em que se reverencia aquele que ela nos aponta.
Então, nesse movimento, que não fica na imagem, mas a ultrapassa e
alcança aquele a quem ela nos remete, venera-se quem é digno de
veneração, e adora-se quem é digno de adoração, ou seja, o
Cristo. O movimento, assim, embora dirija-se (externa, material e
aparentemente) à imagem, dirige-se na realidade ao Cristo, e, por
isso, apenas nesse sentido, cabe falar na adoração à imagem de
Cristo, que, repisa-se, não é adoração à imagem propriamente
enquanto objeto, mas Àquele a quem ela remete e ao qual
verdadeiramente se dirige nossa mente, palavras e gestos, pois “o
culto pela imagem, como tal, não finda nela, mas, tende para o ser
que ela representa”.
Voltando
à aplicação a uma fotografia de um ente querido, o beijo na
fotografia impressa é um ato de expressão de amor que se dirige, de
modo exterior, material e aparente, a um papel impresso com tinta,
mas de modo algum termina nele, pois não é o papel impresso que é
amado. Portanto, é um ato que expressa amor à pessoa fotografada.
Do mesmo modo, a oração, o louvor, as lágrimas, o beijar os pés
ou as feridas, da imagem do Cristo, crucificado, glorioso, menino, de
modo algum expressa adoração ao gesso, tela, madeira, aço, ou
tinta, mas tão somente Àquele Deus que se fez homem e veio morar no
meio de nós, dando sua vida pela salvação de muitos.
É
isso que “aqueles que não entendem difamam” (Jd 1,10). No temor
de cometerem algo contrário ao que agrada a Deus, a mentalidade
protestante ressuscitou a velha heresia iconoclasta, que, ao invés
de compreender a função da arte sacra para a fé e a piedade,
rejeita-a completamente, e vê idolatria em gestos legítimos de amor
a Deus, idênticos aos mais naturais gestos de amor pelas pessoas
queridas, apenas porque não se encaixam em tal mentalidade.
Prossegue
São Tomás de Aquino respondendo às objeções, iniciando pela
primeira, da proibição bíblica de se fazer imagens:
“O
referido preceito não proíbe fazer qualquer escultura ou imagem,
mas, fazê-la para adorar, e por isso acrescenta: Não as adorarás
nem lhes darás culto. Mas, como se disse, o movimento para a imagem
é o mesmo que o para a realidade; por isso, é proibida a adoração
da imagem do mesmo modo pelo qual o é a adoração do ser a que ela
pertence. E por isso se entende a proibição, do lugar aduzido, de
adorar as imagens, que os gentios faziam para venerar os seus deuses,
isto é, os demônios. Donde o acrescentar a Escritura: Não terás
deuses estrangeiros diante de mim. Pois, do verdadeiro Deus, que
é incorpóreo, não se pode fazer nenhuma imagem corpórea; porque,
como diz Damasceno, é suma insipiência e impiedade dar figura ao
divino. Mas, como no Novo Testamento Deus se fez homem, pode ser
adorado na sua imagem corpórea”.
Essa
é a explicação completa do preceito bíblico, e é isso que a
Igreja ensina há milênios. Não se adora os ídolos dos deuses
pagãos, mas o Deus único e verdadeiro, que se fez homem, e portanto
assumiu uma forma material e humana, e desde sempre os cristãos
utilizam símbolos e representações que a ele remetem, desde a
Cruz, na qual Ele nos salvou, o peixe, cuja palavra em grego contém
as iniciais do louvor “Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador”, as
pinturas e esculturas, das quais as mais antigas conhecidas remontam
ao início do século III (mais antigas que a Bíblia enquanto
biblioteca sagrada, isto é, que o cânon bíblico) e,
principalmente, ao século IV, quando o fim das perseguições
permitiu o florescimento da arte sacra.
Sobre
a segunda objeção (não imitar as práticas idólatras dos pagãos),
São Tomás explica que : “a adoração das imagens deve ser
contada entre as obras infrutuosas, por duas razões. Primeiro,
porque certos gentios adoravam essas imagens como se fossem as
realidades, crendo habitar nelas a divindade, por causa das respostas
que os demônios por meio delas davam, e outros efeitos insólitos
semelhantes. Segundo, por causa das realidades que elas manifestavam;
pois, faziam essas imagens, de certas criaturas, veneradas nelas pela
veneração de latria. Ao passo que nós adoramos por adoração de
latria a imagem por causa da realidade que ela representa, como
dissemos”.
Ou
seja, as práticas pagãs, quer de adorar um objeto em si, quer de
adorar por meio dele um falso deus ou demônio, são proscritas.
Adorar Cristo, por meio da sua imagem (já que não se adora a imagem
em si), é justo e devido.
Respondendo
à terceira objeção, de que não se deve adorar o homem por ser
imagem de Deus, escreve: “À criatura racional é devida
reverência, em si mesma. Por onde, se à criatura racional, que é a
imagem de Deus, fosse tributada a adoração de latria, poderia haver
ocasião de erro; isto é, poderia o afeto dos adoradores limitar-se
ao homem, como um determinado ser, sem levar-se até Deus, de que ele
é a imagem. O que não pode dar-se com a imagem esculpida ou pintada
na matéria insensível.”
Ou
seja, o homem tendo personalidade própria, sendo pessoa, ser
racional, não pode ser adorado enquanto imagem de Deus, exatamente
porque, sendo pessoa, essa adoração atingiria ao homem mesmo. Mas a
imagem, por ser mero objeto, sem racionalidade ou personalidade, é
perfeitamente instrumentalizada para a adoração Àquele a quem
remete e é de fato digno de toda a adoração e louvor, Nosso Senhor
Jesus Cristo.
Valendo-nos
novamente do exemplo da fotografia, enquanto ninguém pensaria que o
beijo na foto impressa é um ato de amor ao papel e à tinta, um
beijo no filho de uma pessoa que se ama (que não deixa de ser imagem
e semelhança de seus pais) poderia aparentar ser um ato de amor ao
filho, e não a um de seus genitores. É fácil imaginar situações
em que isso poderia causar constrangimentos. Portanto, se a intenção
é essa, é melhor beijar a foto, que não tendo personalidade não
seria objeto de amor em si mesma.
Enfim
chegamos à resposta à quarta objeção, de que a Bíblia não
ensina a adorar a imagem do Cristo: “Os Apóstolos, por uma
inspiração familiar do Espírito Santo, ensinaram certas práticas
a serem observadas pelas Igrejas, que não deixaram por escrito, mas
na observância da Igreja, através das gerações dos fiéis. Por
isso o Apóstolo mesmo diz: Estai firmes e conservai as tradições
que aprendestes, ou de palavra, isto é, proferida oralmente, ou de
carta nossa, isto é, por um escrito transmitido. E entre essas
tradições está a da adoração das imagens de Cristo. Por isso São
Lucas pintou a imagem de Cristo, que, segundo se conta, está em
Roma.”
Esse
é outro trecho transcrito no panfleto acusatório protestante. A
questão é que, após reunir outros trechos da magistral obra de São
Tomás de Aquino, a Suma Teológica, e seguir os passos de seu
raciocínio na questão proposta, sabe-se perfeitamente o que o
grande Doutor Angélico quer dizer com adoração da imagem de
Cristo. Com efeito, sabe-se que ele se mantém coerente com o
princípio de que “o culto pela imagem, como tal, não finda nela,
mas, tende para o ser que ela representa”. Assim, quando fala de
adorar uma imagem de Cristo, não pretende dizer que se deva adorar o
objeto de gesso ou tinta, mas o Cristo mesmo que é ali representado,
é dizer, é antes adorar a Cristo por meio de sua imagem, ou ainda,
num movimento que se dirige à imagem mas a ultrapassa para visar e
atingir aquele ao qual a imagem nos remete.
Daí
a coerência de sua resposta à quarta objeção, esclarecendo que,
não estando nosso conhecimento da fé limitado à Bíblia, mas
igualmente à Tradição, reputamos perfeitamente lícitas práticas
não prescritas, mas coerentes com o ensinamento bíblico.
São
Tomás chega a supor que deva haver um ensinamento vindo do tempo dos
apóstolos nesse sentido. Isto é possível mas nem é efetivamente
necessário. Basta que o uso das imagens não contrarie a Palavra de
Deus escrita, como explicou São Tomás na resposta à primeira
objeção, e que nos tenha chegado pela Tradição e pelo Magistério
da Igreja, consolidado nessa questão no VII Concílio Ecumênico
(Niceia II). O fato entretanto é que, mesmo no que chegou até nós
(pois objetos antigos não necessariamente sobrevivem por dois mil
anos) realmente Cristo é representado de várias formas (peixe,
cruz, pinturas), desde os inícios do Cristianismo, e que essas
representações remetem a Cristo é a razão de serem feitas, e que
Cristo é adorado é da essência do Cristianismo; logo, pode-se
dizer que essas representações, desde os tempos primevos, foram
meios pelos quais se adorava a Cristo.
São
Tomás de Aquino, portanto, não ensina a adorar imagem alguma. Ao
contrário, reiteradas vezes afirma que a imagem em si mesma é mero
objeto indigno de qualquer consideração. Entretanto, a imagem é
meio, é, como dizemos hoje, linguagem, que remete quem a vê, a
toca, àquele que é “representado”. Se este é digno de
veneração, a imagem é meio de a ele venerarmos. Se é digno de
adoração, é meio de adorarmos. Não se venera nem adora a coisa,
mas aquele ao qual a coisa ajuda a enviar nosso pensamento. Assim, o
gesto vai, externamente, à coisa, mas o sentido vai à pessoa, como
àquele que amamos e de quem temos uma fotografia. Se fala o grande
Teólogo em adorar uma imagem, deixa ele claro que não se trata
propriamente de adorar aquela imagem (objeto), mas ao Cristo, Deus
que se fez homem, ali representado, num movimento que vai para a
imagem, mas visa e chega Àquele ao qual ela remete nosso pensamento.
Há antes nisso, podemos dizer numa linguagem moderna, uma
simplificação, pois ao dizer “adorar a imagem de Cristo” claro
está o sentido de “adorar Cristo por meio de sua imagem”.
Não
deve ser esquecido, entretanto, que a doutrina oficial da Igreja
Católica está acessível e à disposição de todos. O texto do
Catecismo é direto, em linguagem atual, destinado, como se diz,
tanto aos doutos quanto aos indoutos, e visa apresentar de modo claro
aquilo que é crido e ensinado pela Igreja. A honestidade na busca
pela doutrina católica, portanto, deve levar antes ao Catecismo, e
somente como recurso de fundamentação, compreensão histórica e
crítica, a obras de séculos de idade e destinadas, já quando
elaboradas, a iniciados em Filosofia e Teologia. Pinçar obras como
tais, e espalhar trechos que aparentam contrariedade ao que é
efetivamente ensinado pela Igreja como se fosse a fé e prática
católica é algo claramente desonesto, e visa antes à difamação
que à verdade. Felizmente, a verdade brilha nas trevas.