Certa
vez fui passar a Páscoa com uma família de amigos. Resolvi então
comprar um enorme ovo de páscoa, pois era uma família grande, e a
matriarca da família, uma senhora idosa, avó dos meus amigos,
poderia repartir o ovo com todos. Isso é o que a minha mãe fazia
todos os anos: repartia os ovos de páscoa e os bombons entre todos
os filhos, netos, etc. que estivessem na nossa casa para o almoço de
Páscoa. Chegou o dia, e eu entreguei aquele enorme ovo de chocolate
àquela senhora. E ela agradeceu, levantou-se, e guardou o ovo… Foi então que eu tive consciência de que a
minha família tinha uma tradição, que é nossa, não é o costume de todos.
Hoje
eu entendo que tradição é algo que se recebe, que se segue, que se
tem, mas muitas vezes não se tem consciência de que se tem, qual
seu significado e importância, até que surja uma situação em que
essa tradição é posta em relevo ao confrontar-se com uma situação
de negação.
Do
mesmo modo é a Tradição Apostólica, o ensinamento recebido dos
apóstolos em palavras, atos, ritos, atitudes, transmitido de geração
em geração pelos cristãos de todos os tempos e lugares, que também
lhe dão expressões próprias e variadas (as tradições, com “t”
minúsculo e no plural). Nós tomamos consciência de aspectos dessa
Tradição especialmente quando ela é questionada, negada, posta em
dúvida ou criticada. Donde os concílios ecumênicos, as declarações
de dogmas, e porque essas muitas vezes ocorrem séculos e séculos
depois que os apóstolos já morreram.
Com efeito, a Tradição é como um rio que move as pás de um moinho onde se tritura o milho. Em cada saco de fubá está a energia do rio, mas o rio mesmo só é visto se procurado, pois passa debaixo do moinho de onde veio o fubá. Do mesmo modo, a Tradição é algo subjacente a tudo da fé cristã, da vida da Igreja, ela está nos ensinamentos, nos ritos, costumes, devoções, etc. Tudo que o legítimo povo de Deus crê e faz contém algo da Tradição. Noutras palavras, como o rio para o fubá, nas tradições está a Tradição Apostólica, a Grande Tradição, que movimenta a Igreja e faz nascer seus frutos de amor e piedade. Estes frutos não são a Tradição, mas surgem dela, dela recebem sua força propulsora que lhes dá vida e sustentação. E tal como o rio, a Tradição pode ser encontrada por quem a procure, basta seguir a fonte de seus frutos.
Com efeito, a Tradição é como um rio que move as pás de um moinho onde se tritura o milho. Em cada saco de fubá está a energia do rio, mas o rio mesmo só é visto se procurado, pois passa debaixo do moinho de onde veio o fubá. Do mesmo modo, a Tradição é algo subjacente a tudo da fé cristã, da vida da Igreja, ela está nos ensinamentos, nos ritos, costumes, devoções, etc. Tudo que o legítimo povo de Deus crê e faz contém algo da Tradição. Noutras palavras, como o rio para o fubá, nas tradições está a Tradição Apostólica, a Grande Tradição, que movimenta a Igreja e faz nascer seus frutos de amor e piedade. Estes frutos não são a Tradição, mas surgem dela, dela recebem sua força propulsora que lhes dá vida e sustentação. E tal como o rio, a Tradição pode ser encontrada por quem a procure, basta seguir a fonte de seus frutos.
Nessa
linha, nunca se pode dizer que os ensinamentos da Igreja Católica,
os dogmas cristãos, são esses que já foram declarados e somente
esses. Nós não sabemos que questões a Igreja ainda enfrentará, e
que verdades, embora antigas, precisarão ser declaradas
dogmaticamente a fim de afastar o erro.
Fato
é que Nosso Senhor Jesus Cristo apenas pregou oralmente e deu a seus
Apóstolos a ordem de pregar, não de escrever. Por isso, tão logo
ele subiu aos céus, os apóstolos acorreram a todos os cantos do
mundo pregando. Quantas viagens Paulo não fez? Então a Tradição
precede a Escritura, isso é verdadeiro tanto para o Antigo quanto
para o Novo Testamento (sendo particularmente evidente para o Novo
Testamento, que documenta as viagens de Paulo).
E
como qualquer escrito, o Novo Testamento não contém toda a
Tradição. Tal como uma pessoa que escreve sua autobiografia
obviamente não consegue contar todos os detalhes da sua vida, mas se
fixa em alguns pontos que naquele momento (em que está escrevendo)
acredita serem os mais relevantes, a Escritura não tem todos os
detalhes. É impossível assegurar que tudo, toda a pregação dos
Apóstolos, e tudo que é relevante da Revelação para todos os
tempos, esteja escrito no Novo Testamento. Exatamente o contrário é
muito mais plausível.
Mesmo
o fechamento do cânon bíblico, a rigor, é um corte um tanto
artificial, feito para fins práticos, que atesta que aqueles
escritos são inspirados, sendo de apóstolos ou discípulos
imediatos dos apóstolos. Mas isso não significa que não haja algo
além daqueles escritos que mereça fé, ou que a inspiração do
Espírito Santo cessou, pois Ele sopra onde quer e quando quer. De
fato, com o fechamento do cânon, não encontramos na Bíblia vários
textos importantes para os cristãos, como a Carta de Clemente aos
Coríntios, a Didaquê, o Pastor de Hermas, as Cartas de Inácio de
Antioquia, etc. São textos que ensinam sem erro importantíssimas
lições das primeiras eras do Cristianismo. Mas era preciso fechar
as Escrituras para os cristãos em algum ponto, e isso foi feito.
Entretanto, supor nisso uma ruptura na doutrina cristã, como se
naquele momento acabasse a inspiração do Espírito Santo, e não
corresse viva a Tradição vinda dos Apóstolos, é totalmente
artificial e contrário à realidade.
Graças
a Deus, além dessa Tradição se manter viva na Igreja Católica,
muito dela está documentada, preservada nos testemunhos dos cristãos
das gerações que nos precederam, onde encontramos provas históricas
de nossas raízes.
Por
outro lado, dizer que algo está na Escritura, algo está na
Tradição, algo está no Magistério, , somente revela uma má
compreensão desses elementos. Um único é o depósito da fé, como
bem acentua a Dei
Verbum,
é a Revelação de Nosso Senhor Jesus Cristo que se fez homem, e
cujo ensinamento, em gestos, palavras, obras, foi transmitido pelos
apóstolos (palavra que significa enviado) e cuja continuidade é a
Igreja, que já São Paulo ensinava, é o Corpo de Cristo, coluna e
sustentação da Verdade.
Assim,
sendo a Tradição a continuidade desse ensino do Cristo, na vida e
doutrina da Igreja, sendo a Escritura a parcial condensação dessa
Tradição em escritos da era apostólica, e sendo Magistério o
exercício da Autoridade conferida por Nosso Senhor à Igreja, o
depósito da fé é único, abrangendo e englobando esses três
aspectos de modo indissociável, e pode-se dizer que é a Igreja
mesma. Em outros termos, os três formam um só corpo, que é o
depósito da fé, e que a seu turno é a continuidade do ensinamento
do Cristo, cuja obra é continuada na Igreja, que é o seu corpo.
Portanto, os três, Tradição, Escritura e Magistério, são o
prolongamento do ensinamento e ação do Cristo mediante a Igreja,
portanto, são a Igreja.
Entretanto,
essa identificação do depósito da fé é algo essencialmente
inadmissível pelos protestantes. Primeiro, porque o Protestantismo
nasceu da rejeição da Igreja Católica. Segundo, porque é da
natureza do Protestantismo que tudo seja questionável, a partir da
rejeição da Autoridade e da Tradição em favor do Livre Exame da
Bíblia, tornando-se cada qual o juiz da verdade segundo a própria
interpretação da Escritura. Mas é um erro pretender separar a
Escritura da Igreja, da Tradição e do Magistério. Escritura sem
Tradição e Magistério é apenas um livro, mais um livro, com o
qual se pode fazer de tudo, que admite qualquer interpretação, que
está sujeito ao uso e ao abuso. Mas no contexto da Igreja, ela entra
na grande corrente da Tradição, numa relação recíproca de
compreensão e estabilização, e quando avultam disputas, a Igreja
está presente para re-estabilizar esse grande caudal apaziguando o
mar e os ventos com a Autoridade que Cristo lhe confiou exercendo o
Magistério.
Portanto,
a nossa fé vem dos apóstolos, pelo meio que os apóstolos deixaram,
a Igreja pela qual Cristo deu seu sangue, como afirma São Paulo.
Nada menos, nada mais. E embora possamos diferenciar conceitualmente
os elementos da Tradição, da Escritura e do Magistério, eles de
tal modo compõem o depósito da fé da Igreja que são em verdade um
só e único, e se identificam com a Igreja mesma, Corpo de Cristo e
prolongamento visível de sua ação no mundo, com seus ensinamentos,
seus ritos, suas ações. E como tudo que é unido, quando separados,
se enfraquecem e se desintegram.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários que manifestarem discordância mas que não apresentarem argumentos racionais sobre o conteúdo do artigo serão sumariamente excluídos, ressalvada decisão do Administrador em sentido contrário. Qualquer comentário poderá ser excluído a qualquer tempo por vontade livre do Administrador.